ORLANDO CAETANO

 

 

 

Orlando Caetano

 

 

DEIXASTE ABERTA A PORTA DA PALAVRA

Orlando Caetano

 

Saboreio-te as palavras lentamente

bebendo-as devagar

p’ra conservá-las,

e ao aprender de ti

a ti me prendo.

 

É na relação das palavras

que se constrói a paz

se descongela a vida.

Um ai que se grite

há-de encontrar um eco.

 

Verbalizar o amor

é acariciar o corpo com a boca

na distância reduzida pelo afecto.

 

Deixaste aberta a porta da palavra.

 

 

 ROMANCE

Orlando Caetano

 

 Sou de azul.

A casa em que a minha alma mora

é pintada de azul.

Escolhi esta cor

só porque gosto muito dela.

Os tons fui buscá-los

ao céu e ao mar

numa manhã de Abril.

 

Para combinar com essa cor de fundo

trouxe amostras de nuvens

e de espuma do quebrar das ondas.

Fiz então desse branco em focos

cortinados

estofos

ornamentos.

Ah trouxe também uma rosa

vermelha

acetinada

p’ra dar um toque de beleza

e arte

e sensualidade.

 

Finalmente

pus cá dentro uma vela sempre acesa.

E quando tu vens ver-me

o branco és tu

o azul sou eu.

Depois entra o céu

e também entra o mar

a espuma

e rosas às centenas!

 

O romance começa

o tempo passa…

Não há “final feliz”

apenas porque ao fim nunca se chega.

 

  

INTROVISÃO CRIATIVA

Orlando Caetano

 

Fecha os olhos e vê.

Dentro de ti há cores

imagens de pássaros

e flores

tudo o que sonhaste

no embalo do desejo:

aquele olhar meigo,

aquela voz suave,

aquele doce beijo.

 

Depois

abre os olhos.

E essa fantasia tão real,

teu paradoxo e teu dilema,

transpõe para a tela

molda em escultura

faz dela melodia

ou escreve-a num poema.

 

 

 QUIXOTE

Orlando Caetano

 

Sorrir é mais fácil

quando não há vento

e a neblina cerrada

põe-me míope.

 

Avanço

com a audácia

do meu medo avanço

de espada em punho avanço

mas a cortina opaca

ri-se da minha figura triste

de quixote.

 

Enfurecido luto

de espadeirada

em espadeirada

avanço na cegueira

de ver tudo

tudo o que além da neblina

está à minha espera.

 

Lutei até cair

mas não vencido.

No sonho de acordar

do outro lado

vislumbro agora

o Sol nascente

que cresce em mim

que vem beijar-me a fronte.

 

E já sorrio, enfim!

  

 

 

NA CIDADE

Orlando Caetano

 

 

Há círios de alcatrão

no compacto da urbe.

Esbugalhados

olhos

de cimento

vidrados,

opacos,

congelam terror.

 

Há bichos

bípedes

nas tocas

nas celas

nos caixotes

que empacotam

homens-bichos.

 

E há máquinas,

orquestras de máquinas

a produzir ruídos

grossos

com dedos longos

unhas agudas

riscando ardósias

ecos uivantes

sons irritantes

de enlouquecer…

 

Na cidade

onde as pessoas

já não são pessoas

e apetece morrer.

 

 

 

Leiria/Portugal

Esta entrada foi publicada em POETAS AMIGOS com as etiquetas . ligação permanente.

Uma resposta a ORLANDO CAETANO

  1. branca diz:

    Fala o CORAÇÃO do poeta…LINDOS Poemas!Reflectem, a realidade de um coração sensível e atento!PARABÉNS!!!Branca

Deixe um comentário